Reportagem
'CAIXA DE PANDORA' VOLTA À CENA PAULISTA
O clássico do cinema mudo está na lista de exibições da
42º Mostra Internacional de Cinema de São Paulo
por Cássio Lima

'Existem muitos filmes com elencos maravilhosos, alguns com atores ou atrizes de enorme destaque dentro de sua estrutura e um punhado em que esse ator ou atriz se torna sinônimo da obra que estrela. E, finalmente, existe Louise Brooks em A Caixa de Pandora' - Plano Critico | FOTO: divulgação
O empoderamento feminino está em alta e invadiu a tela grande da tradicional 'Mostra Internacional de Cinema de São Paulo'. Durante duas semanas, de 18 a 31 de outubro, serão exibidos 331 títulos em diversos endereços. O circuito inclui cinemas, espaços culturais e museus espalhados pela terra da garoa, além de projeções ao ar livre, sem cobrança de ingressos.
No dia 27 de outubro vai acontecer uma das atrações mais esperadas desta edição - a sessão no parque Ibirapuera. Em cartaz o filme alemão 'A Caixa de Pandora' (1928), do diretor Georg Wilhelm Pabst. A projeção ainda contará com a participação da Orquestra Jazz Sinfônica, sob o comando do maestro Fábio Prado. As atrações começam sete da noite.
O Diretor
Wilhelm Pabst assinou a direção de 'A Caixa de Pandora', ele nasceu no antigo Império Austro-Húngaro, hoje República Tcheca, em 1885. Famoso diretor da era do cinema mudo, Pabst realizou 'O Tesouro', seu primeiro longa-metragem, em 1923. Durante toda carreira dirigiu cerca de 30 títulos. Porém, uma vez que Pabst foi um desses diretores livres, que não gostavam de ficar presos a uma série de regras ou preceitos estéticos (como todos os grandes artistas), logo no seu filme seguinte ele abordou a psicanálise. Foi, inclusive, o primeiro a fazer isso. É verdade que a teoria analítica criada por Sigmund Freud esteve presente desde os primórdios do cinema, mas, até então, ela tinha aparecido de maneira implícita ou como um componente estruturante da realidade cinematográfica. Em 'Segredos de uma Alma', a abordagem de Pabst é realista e direta (mesmo tendo alguns elementos surreais e oníricos), o que fez com que novos territórios fossem desbravados e o seu cinema atingisse outros patamares. Pode até se dizer que pavimentou o chão sobre o qual ergueria suas três obras-primas seguintes: A Caixa de Pandora, Diário de uma Garota Perdida e Guerra, Flagelo de Deus.

'Injustamente esquecido, Georg Wilhelm Pabst é um dos principais diretores alemães da primeira metade do século XX" - Cineplot | FOTO: reprodução
A Caixa de Pandora
O longa conta a história de uma mulher bela e amoral que destrói todos aqueles que estão sob seu feitiço; a personagem Lulu é a encarnação de um feminino pré-moral. A personagem de Louise Brooks se envolve com o dono de jornal Dr. Schön. O rico empresário está de casamento marcado, porém a noiva o flagra com a amante e decide por fim ao relacionamento. Em compensação, ele resolve se casar com Lulu. A trama começa a se desenvolver quando os papéis são invertidos na relação de gênero, onde o masculino passa a ser dominado pelo feminino.
A feminista Andressa Avelar está no décimo período do curso de Direito, no Centro Universitário do Triângulo (UNITRI). Segundo a universitária, a sociedade construiu que as mulheres devem ser padronizadas e, o cinema é uma ferramenta de desconstrução de esteriótipos. "O empoderamento feminino nas artes em geral é importante, porque consegue influenciar. Cada mulher tem um corpo, uma mente, uma personalidade! E isso não se padroniza", defende Avelar. Já a estudante, Gabriela Petusk, do curso de Jornalismo na Universidade Federal de Uberlândia (UFU), reforça a importância do protagonismo feminino, em que a mulher supera a condição de mero acessório cenográfico. "Cinema é algo que tem impacto social, portanto, ter personagens que não são apenas decoração visual, mas, com uma personalidade e um papel no enredo, contribui melhor para o gênero. Além de incentivar outras mulheres, que inspiram nesse comportamento", relata.
Ambientado no século passado, mas precisamente no final da década de 20, a narrativa cinematográfica exibe um comportamento feminino que supera as imposições do machismo. Depois de uma cena de ciúme em 'Caixa de Pandora', o marido tenta matar Lulu, mas a moça escapa e em legítima defesa acaba matando-o. Acusada de assassinato, a mulher foge com o filho da vítima, que também é apaixonado por ela. Assim, os dois acabam se envolvendo em um jogo de sedução, fugas e exploração sexual. As evidências da personalidade, do desejo e das vontades de Lulu ganham notória projeção e guia a lente do diretor do começo ao fim. "É um convite ao universo feminino, de olhar a mulher pelo parâmetro da mulher", diz a psicóloga Renata de Assis ao explicar a importância em direcionar a narrativa para a protagonista. Assis diz ainda, que o clássico mostra a incompatibilidade de gênero, a dificuldade de entender a mulher de forma substantiva, plena.

'A atriz Louise Brooks nasceu em 1906 no Kansas e desde sempre foi muito precoce: aos quatro anos participava de espetáculos de dança nas proximidades de sua cidade, incentivada pelos pais, um advogado e uma dona de casa, ambos liberais na educação dos quatro filhos e igualmente admiradores das artes' - Obvious | FOTO: reprodução
A Mostra
A 42º Mostra Internacional de Cinema de São Paulo faz um apanhado do que o cinema contemporâneo mundial tem produzido, além de apresentar tendências, temáticas, narrativas e estéticas. A Mostra é composta de seis seções: Apresentações Especiais, Homenagens, Restaurações, Competição Novos Diretores, Mostra Brasil e Perspectiva Internacional. Desde 2017, o evento também apresenta filmes de realidade virtual.
Ficha Técnica
- 'Caixa de Pandora'
Ano: 1929
País: Alemanha
Direção: Georg Wilhelm Pabst
Roteiro: Georg Wilhelm Pabst, Ladislaus Vajda, Joseph Fliesner
Produção: Seymour Nebenzal, Heinz Landsmann, George Horsetzky
Elenco: Louise Brooks, Fritz Kortner, Francis Lederer, Carl Goetz, Alice Roberts, Krafft-Raschig